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Ao cantar Tim Maia, Renato Braz voa no álbum ‘Canário do reino’ na altitude habitual do grande intérprete paulistano

Renato Braz canta 15 músicas do repertório de Tim Maia (1942 – 1998) no álbum ‘Canário do reino’ Beatriz ID / Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE DISCO T...

Ao cantar Tim Maia, Renato Braz voa no álbum ‘Canário do reino’ na altitude habitual do grande intérprete paulistano
Ao cantar Tim Maia, Renato Braz voa no álbum ‘Canário do reino’ na altitude habitual do grande intérprete paulistano (Foto: Reprodução)

Renato Braz canta 15 músicas do repertório de Tim Maia (1942 – 1998) no álbum ‘Canário do reino’ Beatriz ID / Divulgação ♫ OPINIÃO SOBRE DISCO Título: Canário do reino – Uma homenagem a Tim Maia Artista: Renato Braz Cotação: ★ ★ ★ ★ ♬ Cantor da linha tradicionalista de Dori Caymmi, o paulistano Renato Braz chegou tarde no mercado da música, em meados dos anos 1990, quando a MPB já não dava as cartas no jogo fonográfico. Na ala masculina, Braz simboliza o que a conterrânea Mônica Salmaso representa no universo feminino da MPB. Ambos têm grandes vozes postas a serviço de uma música de beleza atemporal, mas já sem força mercadológica. Só que parece faltar a Braz habilidade e disposição para atrair os seguidores da MPB, como fez Salmaso. Tanto que o álbum Canário do reino – Uma homenagem a Tim Maia chega ao mundo hoje, 13 de outubro, quase em silêncio com 15 faixas produzidas por Braz com Mário Gil. Somente por trazer a última gravação de Nana Caymmi (1941 – 2025) – cujo canto de cisne em A lua e eu (Cassiano e Paulo Zdanovski, 1975) sucede a abordagem de Azul da cor do mar (Tim Maia, 1970) no medley da faixa final – o álbum já merece atenção. Contudo, Braz surpreende e voa em Canário do reino – na altitude permitida pela alma tradicionalista do cantor – ao dar voz grave e afinada ao repertório de Tim Maia (1942 – 1998), um dos pilares do soul e do funk brasileiros que irromperam no alvorecer da década de 1970. Escorado em arranjos e/ou vocais geralmente exuberantes, o cantor apresenta grandes e comportados registros de Eu amo você (Cassiano e Silvio Roachel, 1970) e Você (Tim Maia, 1969), duas baladas embebidas na atmosfera soul. Entre uma e outra, Braz exibe certa bossa nos pulos de A rã (João Donato e Caetano Veloso, 1974), música nunca associada ao vozeirão de Tim, mas gravada pelo Síndico no álbum Tim Maia interpreta clássicos da bossa nova (1990), do qual Braz também fisgou Eu e a brisa (Johnny Alf, 1967), música que reaviva em feat majestoso com Áurea Martins. O arranjo de A rã tem um toque de jazz. O álbum Canário do reino é tributo de um grande cantor para outro da mesma dimensão, embora a voz de baixo-barítono de Tim Maia tivesse tessitura inigualável e uma alma que às vezes inexiste no canto tecnicamente irretocável de Braz. Em voo inusitado diante da discografia anterior de Braz, o cantor evoca os Pífanos de Caruaru no arranjo do baião-soul Coroné Antonio Bento (João do Vale e Luiz Wanderley, 1970). Unida em medley com Você e eu, eu e você (Juntinhos) (Tim Maia, 1980), funk cantado por coral feminino, Sossego (Tim Maia, 1978) soa na voz de Braz como cover de Tim até seguir o baile com citação sagaz de Billie Jean (1982), hit de Michael Jackson (1958 – 2009) no álbum blockbuster Thriller (1982). Com toque de samba na introdução em que Braz saúda ícones da black music como Tony Tornado, Carlos Dafé, Cassiano (1943 – 2021), James Brown ((1933 – 2006), Gilberto Gil e o mencionado Michael Jackson, além de João Gilberto (1931 – 2019), a gravação de Imunização racional (Que beleza) (Tim Maia, 1975) se aproxima do território do cover, assim como O descobridor dos sete mares (Michel e Gilson Mendonça, 1983), aliciante tema desbravado por Braz na introdução com vocais e uma percussão afro-brasileira até o arranjo começar a singrar na onda da banda Vitória Régia. Cover mesmo, e pálido, é Um dia de domingo (Michael Sullivan e Paulo Massadas, 1985), balada cantada por Braz com Beatriz ID, esta na parte que coube a inigualável Gal Costa (1945 – 2022) na gravação original feita por Tim para disco de Gal. Samba-canção gravado por Tim no segundo álbum, em 1971, Preciso aprender a ser só (Marcos Valle e Paulo Sérgio Valle, 1965) ressurge classudo no canto de Braz, com arranjo à meia-luz calcado no piano e no sopro, mas sem o toque de soul de Tim. Surpresa da seleção do álbum Canário do reino, o samba-soul Over again (Tim Maia, 1973) mostra que Braz conhece bem (ou pelo menos pesquisou bem) a obra do homenageado. Se Chocolate ganha a voz solo de Dorival Braz, filho de Renato, em gravação que busca o ar lúdico da infância, Neves e parques (Michel e Gilson Mendonça, 1983) é joia rara da discografia de Tim lapidada pela voz de Renato Braz enquanto Só é poema de Edgar Allan Poe (1809 – 1849) recitado por Augusto de Campos como preâmbulo para o canto límpido de Azul da cor do mar. E então ouve-se a voz de Nana Caymmi em A lua e eu sobre o piano de Cristovão Bastos. Cabe ressaltar que Tim Maia nunca gravou A lua e eu, mas a faixa evoca a alma e o soul deste cantor carioca que habitou universo musical distinto do macrocosmo da MPB de Renato Braz e Nana Caymmi, mas, como a música brasileira desconhece fronteiras, o álbum Canário do reino harmoniza dois mundos com a beleza da voz deste cantor de espírito tradicionalista. Capa do álbum ‘Canário do reino’, de Renato Braz Divulgação